Educação Emocional aumenta o bem-estar e previne suicídio entre crianças e adolescentes
Pedagoga traz orientações de como favorecer a Inteligência Emocional para os mais jovens; confira entrevista na íntegra
Trabalhar a emoção de crianças e adolescentes contribui para o aumento do bem-estar e ajuda a prevenir suicídios. Esse é o tema do Momento Saber de Hoje que neste mês participa da campanha nacional Setembro Amarelo e na edição de hoje conversou com a pedagoga e especialista em Inteligência Emocional, Carmen Silvia Carvalho, que desenvolve o trabalho das emoções em escolas.
Confira como foi o bate-papo e clique no vídeo ao final para conferir a entrevista completa.
Momento Saber - Para crianças e adolescentes é mais difícil lidar com as emoções? Por que?
Carmen Silvia - Crianças e adolescentes, além do desenvolvimento fisiológico, de percepção do próprio corpo e da fisiologia, também se encontram no processo de amadurecimento do córtex frontal, uma parte do cérebro que é fundamental no trabalho de educação das emoções a partir da regulação da emoção: saber o que fazer quando sinto raiva, tristeza, alegria. Eles precisam de um trabalho de educação voltado inicialmente para a percepção das emoções. Como a emoção se manifesta em mim para que eu possa trabalhar com aquilo que a ciência chama de Inteligência Emocional, ou seja, usar minha racionalidade, minha capacidade de reflexão para compreensão e educação do que estou sentindo.
Momento Saber - O que é educação emocional?
Carmen Silvia - Educação emocional tem como pressuposto as habilidades socioemocionais ou softskills, popularmente conhecidas como Inteligência Emocional. A educação da emoção é a percepção e a compreensão de como os estímulos que a vida me oferece chegam ao meu sistema emocional. Todos nós, antes de um comportamento manifesto, recebemos algum tipo de estímulo, como o barulho de um carro, a voz da mãe, a proximidade de alguém que amo, ou, ao contrário, de alguém que não gosto muito. Isso tudo dispara uma emoção que dá um sinal de alerta para meu corpo, positivo ou negativo. Educar a emoção é compreender esse funcionamento inicialmente no meu corpo, por que a emoção é rápida, breve, passageira e fisiológica.
No adolescente ainda tem a questão de viver uma explosão hormonal, de pulsão sexual, de desejos que envolvem conquistas e decisões como vestibular. Isso gera uma emoção muito voltada para a toxidade que a ansiedade e o estresse podem nos trazer. Na criança, assim como no adolescente, como ela ainda está identificando o próprio corpo, conhecendo sistemas novos como a escola, o clube a igreja, o balé, ela ainda não consegue assimilar os estímulos emocionais que surgem no corpo. Quando chega em um lugar e fica emburrada, ela está pedindo socorro porque sentiu algo que ainda não conhece: pode ser o medo, a insegurança, sensação de abandono porque os pais vão embora, e ela ainda não tem o registro anterior dessas experiências emocionais. Quanto antes começar a trabalhar com a educação das emoções, auxiliando nossas crianças e adolescentes a falarem sobre o que estão sentindo, a deixar que eles manifestem com a linguagem e recursos que eles têm as suas próprias emoções e depois, num outro momento, em que estiverem voltado à calma, conversar mostrando empatia, dizendo que você compreende o que sentiam, mas que existe forma melhor de manifestar a emoção.
A emoção passa, mas algo fica e fica para sempre a depender da forma como vamos educar na emoção vivida: os sentimentos. Deles poderão surgir crenças que vão nos auxiliar muito ou nos prejudicar bastante ao longo da vida.
Momento Saber - Como a educação emocional auxilia na prevenção ao suicídio entre crianças e adolescentes?
Carmen Silvia - Algo que tem nos assustado é o crescente número de suicídios entre crianças e adolescentes. Algo que a emoção traz de grande ajuda e de suporte para os momentos de adversidade, é a questão da compreensão de como eu sinto além dos recursos que eu tenho. Ensine a eles sobre o “sinaleiro do autocontrole”. Algo veio e me levou a um momento de descontrole emocional, eu me senti inseguro, tive medo, tive um esquecimento daquilo que estudei muito para a prova. Neste momento eu digo ‘pare’, sinal vermelho. Diante de algo que desestabiliza, pare. Acione o sinal amarelo, respire profundamente. A respiração diafragmática é conhecida como a respiração contra a ansiedade. Projete o abdômen, conte a até quatro, retenha esse ar quatro ou cinco tempos e solte devagar pela boca. A medida que tomo essa consciência de que existem recursos para lidar com a frustração e com o medo, isso constrói recursos cognitvos que auxiliarão num momento de grande frustração em que eu começar a pensar que minha vida não vale a pena e que eu não tenho condições de superar uma adversidade. Converse com seu filho, mostre quantos recursos ele tem para favorecer a compreensão de que os momentos emocionas são passageiros.
Momento Saber - Como favorecer o desenvolvimento da inteligência emocional em crianças e adolescentes?
Carmen Silvia - Nesta abordagem do que podemos fazer para auxiliar a educação emocional das nossas crianças e os adolescentes, tenho algumas orientações de como auxiliá-los no sentido de desenvolver a inteligência emocional. Primeiro é observar as nossas crianças. Se ela apresenta algum sintoma emocional diferente, esse é o momento de aproximar e buscar o momento em que ela verbalize o que está sentindo. Está ansiosa, com medo, com raiva? A raiva é uma emoção muito visceral na criança, especialmente até 7 anos. Quando ela sofre uma frustração, ela não tende à depressão, tende à raiva, porque há um nível de pulsão, no sentido do ego, de voltar para ela, muito forte. Isso precisa ser educado e não retirado dela. Segundo, evite educá-la a partir de estímulos de agressão. Gritar, bater, beliscar, puxar os cabelos, colocar de castigo sem que haja qualquer reflexão anterior. Se ela não compreende a emoção, muito menos ela compreenderá porque está sendo agredida com tapas ou porque está de castigo, sendo que ela já estava infeliz antes e ela foi castigada sendo que antes ela já estava infeliz antes e foi castigada para que sofra mais a infelicidade. O diálogo é muito importante para que a criança perceba o que ela sentiu e qual foi a situação estímulo que gerou a emoção. Mas faça esse trabalho de análise quando a criança estiver calma, quando a crise tiver passado. No ato do grito, da manhã, treine você sua educação emocional. Respire, busque seus recursos porque não é a hora de atuar. Do contrário acabamos por reforçar um princípio de pulsão agressiva. Terceiro, respire. Como eu já disse a respiração diafragmática é um recurso cognitivo para acalmar e educar as emoções. A isso nós chamamos mente plena, ou mindfulness: preciso estar aqui e agora. Uma sugestão é fazer a brincadeira de cheirar uma flor e soprar uma velinha sem apagar para que o ar tenha um fluxo constante, sem muita força, permitindo que o oxigênio permeie todas as células, auxiliando o sistema emocional a sair do estímulo de perigo em que a emoção o colocou. Assista ao vídeo para mais sugestões de atividades de respiração. Já com adolescentes podemos trazer estímulos como o da hora do almoço, que chamamos de mindful eating: o momento da alimentação em atenção plena. Voltemos aos momentos que nos alimentávamos reunidos em mesas. A comida é um momento sagrado da educação emocional. Sente-se com seus filhos e alunos no momento das refeições, sem tela. Vamos mastigar sentindo o gosto dos alimentos, a temperatura, a textura. Essa técnica ajuda a tirar a pessoa da ansiedade, que é uma emoção de alta toxidade que nos tem afetado muito a saúde mental. O nível de ansiedade alto pode nos levar ao pânico, à depressão, e a abrir portas até para o suicídio. Terceiro, brinque em família para que as crianças e adolescentes possam estimular a capacidade estratégica e crítica, para que conheçam esse recurso e usem no momento de perder o jogo. Nunca caia no erro de empatar o jogo com seu filho. Aprender a ganhar e perder é algo muito importante para que a nossa emoção ganhe saúde, resiliência e resistência no combate a todo elemento de frustração que a vida pode nos trazer. Quarto, compartilhe suas histórias de ansiedade, frustração e dor, mostrando que na vida adulta também perdemos a regulação emocional, fazemos coisas impensadas, choramos e sentimos coisas que depois percebemos que não nos faz feliz. E quinto e mais importante: fale sobre gratidão desde muito pequenos. A gratidão é a emoção que maior índice dopaminérgico libera no nosso corpo, isso significa que aprender a agradecer pelo que temos nos mantém no aqui e no agora liberando em nosso organismo elementos fundamentais para a manutenção do nosso bem-estar. Se nós liberamos hormônios e neurotransmissores que são positivos e elevadores do bem-estar, isso favorece o aumento do escopo cognitivo, ajudando no foco, concentração, memorização e alta performance.
Momento Saber – Gostaria de deixar alguma mensagem para as famílias?
Carmen Silvia – Quero convidar as famílias para voltar aos hábitos que aproximam, voltem a se alimentar juntos, não deixem os filhos muito tempo fechados dentro do quarto, crie rotinas em que vocês tenham tempo de qualidade juntos. Não é a quantidade de tempo que fará a diferença, mas a qualidade. Promova momentos de compartilhamento de experiências, mas sem o famoso “como foi seu dia na escola hoje?”, mas outros momentos. Chegue em casa contando das suas dificuldades e como você as superou. E uma coisa muito estudada e falada e indicada por sociedades de especialidades médicas: a busca da espiritualidade. Hoje já existe um ramo científico chamado de inteligência espiritual. Isso significa não buscar uma religião, mas momentos em que a transcendência se faça nessa família. O respeito mútuo, a presença afetiva, a paciência em momentos em que já estamos cansados das nossas próprias dificuldades emocionais. As crianças e adolescentes são responsabilidades nossa e precisamos dedicar a eles momentos de diálogos afetivos, de escuta empática. Menos julgamento, mais amor, mais empatia.